Quem Diria?!
Encontro-me diante de um
quadro de traços simples que me enrola nas suas ondas desenhadas a carvão e me
leva ao sabor da maré da memória vinte milhas atrás.
Estava um maravilhoso dia
de verão. Éramos ainda duas meninas, primas mas parecidas como irmãs e sempre
prontas para a diversão.
Trocara temporariamente o
barulho louco da cidade grande pela melodia harmoniosa desta pequena cidade.
(Quem diria que um dia a troca seria permanente?!)
Saímos para andar de
barco. Era o primeiro passeio de barco da minha vida!
Guiada pela emoção daquela
estreia e pela mão cúmplice que me puxava para a frente, sentei-me na proa, pés
borda fora, cabelos ao vento, enquanto o motor ganhava cada vez mais força numa
provocação controlada de quem nos queria intimidar.
A adrenalina que me
invadia emparelhava com as hormonas da idade ao som da música intensa que soava
no rádio. (Quem diria que hoje ainda me lembraria dela?)
Recordo-me do gozo que nos
dava sermos puxadas num “tubarão” de borracha em que nos encavalitávamos com
esforço para sermos facilmente deitadas ao mar logo em seguida.
Mar que vejo da janela e
me traz de volta ao desenho de infância esquecido numa capa durante anos e reencontrado
pela força do destino. Desenho em que as minhas mãos fizeram o favor de
conservar a imagem de mim mesma na proa do barco que puxa o “tubarão”, ao som
das notas de música que saem do rádio. Desenho do qual não consta aquele que
tenho agora ao meu lado, porque também não consta da memória que, neste ponto,
me falhou redondamente mas que um dia reencontrei, como que por magia, trazido
pela maré da vida. Por ele, ancorei nesta pequena cidade para sempre.
Quem diria?!
Sofia Cardoso
27 de maio de 2012
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