Tudo o que me deste
Momentos como o desta noite deixam-me sempre alcoolizada de emoção e
normalmente só no dia seguinte, sob ressaca musical, me lanço a escrever. No
entanto, hoje não consigo desligar sem antes desbobinar porque amanhã é sempre
tarde demais e preciso mesmo de fazer o que ainda não foi feito.
Não sabia bem o que esperar de um concerto teu, em pleno verão, num
espaço aberto, repleto de cadeiras ocupadas, com um palco ali tao perto, depois
de te ter visto no Terreiro do Paço, repleto de pessoas de pé, com um palco lá
tão longe, em pleno inverno…
Começaste tão bem, viajando connosco, fazendo com que logo aí a cadeira tão
atrás me começasse a fazer comichão. Puseste-nos à vontade para nos levantarmos
e pouco depois estávamos lá no fundo para não incomodar quem se mantinha confortavelmente
sentado. Daí até percebermos que, na verdade, de forma tão inesperada quanto
desejada, querias mesmo era que nos aproximássemos para nos sentirmos, contigo,
de regresso a casa, foi um saltinho e depressa tinhas parte da plateia (a atrevida
e muito menos preocupada com a visibilidade de quem se mantinha sentado do que
com a tua manifesta vontade…) literalmente aos teus pés.
A partir desse momento, foi um crescendo de sensações, de recordações, que
me levaram da idade adulta de volta à adolescência, 20 anos lá atrás, sentada nas
aulas de filosofia a eternizar no papel as letras das tuas músicas, passando do
riso estridente ao choro silencioso em 20 segundos, agora ali à tua frente.
Não posso ver um homem sentado ao piano: facto. Os teus dedos a deslizar nas
teclas, enquanto as pingas de suor visivelmente pingavam e os meus dedos a
deslizar sobre a face, enquanto as lágrimas discretamente escorriam, tudo em
perfeita sintonia. Porque a música, não me canso de repetir, faz magia. Aleluia!!!
E de pé, estivemos, assim, todos sentados à tua mesa, convidados a saborear
o A-M-O-R. Todos unidos pela intemporalidade do teu sucesso, que cria pontes
entre gerações, tornando possível a imagem, digna de moldura, de uma filha
pequenina, às cavalitas da mãe, sabendo cada nota do caminho de volta para os seus
braços. Que ternura…!
Sim, há noites que passo sem dormir, mas vale sempre a pena porque deste-me
um momento lindo para agarrar as palavras que registam uma noite encantada para
o resto da vida…
E tudo o que eu te dou é o resultado de tudo o que nos deste a todos nós…
Sofia Cardoso
21 de agosto de 2015
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