Incapacidade
Poderia enveredar
pelo doloroso caminho já tantas vezes percorrido e focar-me na perda… Também
poderia deter-me num medo mais comum e muito menos inquietante e dissecar os
sonhos que aqui e ali me fazem gelar na presença de um ser rastejante,
escamoso, comprido e venenoso a perseguir-me. Mas não. Há um medo maior,
porquanto mais lato...
Senhora de mim como
ninguém, não posso deixar de considerar a incapacidade como o meu maior receio.
Temo a incapacidade
física causada por doença ou acidente. Aquela que atira um corpo enérgico, que
corre atrás da vida, para uma cama de um qualquer quarto lúgubre ou para uma
cadeira que não mata mas limita. Sim, temo. No entanto, mesmo que este cenário
realidade se tornasse, teria sempre intata a minha garra interior que me
poderia levar onde quisesse, nem que tivesse apenas a imaginação como meio de
transporte.
Daí que o medo suba
um degrau na escala rumo ao pânico e passe a referir-se à incapacidade de
discernir, de decidir, de agir. O bloqueio da depressão, do buraco sem fundo em
que algumas pessoas caem e o qual negarei em mim até à morte, ainda que o tema.
Temo-o, sim, porque o reconheço, o respeito e, inclusivamente, tudo faço para
ajudar quem com ele se debate.
E depois, de volta
à maternidade, incontornável desde que o cordão umbilical é cortado, unindo
assim dois seres até à eternidade, surge o medo último, o do topo da escala,
roçando o terror… A incapacidade de educar. De semear os grãos de princípios
básicos que florescerão em pétalas de valores vários, coloridos, perfumados,
atrativos a outros seres que neles reconhecerão vida pura onde pousar.
Parece que ninguém
teme fazer filhos… Sob determinado ponto de vista, é uma pena, pois considero
que este receio seria extremamente positivo, se se instalasse.
Responsabilizaria mais quem assume este compromisso perpétuo que deveria
elevar-se a missão na vida de todos quantos se arrogam esse direito.
Feitas as contas
aos degraus, o que importa mesmo é estar em forma para correr deles, escada
abaixo, sem olhar para trás.
Há que parecer
forte e ser implacável no combate à vulnerabilidade. Confiar cegamente no que
está cá dentro e fazê-lo de escudo a tudo o que adversamente vier de fora.
Ser guerreiro,
mesmo em tempo de paz!
Sofia Cardoso
21 de fevereiro de 2015
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